Batalha contra o câncer

Estilo de vida e envelhecimento forçam aumento de casos

Envelhecimento da população brasileira aliado ao estilo de vida com altos níveis de obesidade, sedentarismo, infecções por HPV, abuso de álcool, tabagismo e excesso de exposição ao sol são os fatores de risco que vêm puxando para cima a incidência de câncer no país, segundo projeções para 2014 divulgadas ontem pelo Ministério da Saúde e pelo Instituto Nacional de Câncer (Inca). Estima-se que ano que vem haverá redução de cânceres de colo do útero e pulmão (no caso de homens), o que de acordo com o governo federal é reflexo das campanhas contra o cigarro e do acesso de mulheres ao exame papanicolau e ao tratamento precoce, embora os números continuem alarmantes. Para especialistas, uma preocupação é com o câncer de cólon.

Entre os homens, os mais prevalentes serão: próstata (70 por 100 mil habitantes); traqueia, brônquio e pulmão (16/100 mil); cólon e reto (15/100 mil) e estômago (13/100 mil). Já nas mulheres, estão mama (56/100 mil); cólon e reto (17/100 mil); colo do útero (15/100 mil); e traqueia, brônquio e pulmão (10/100 mil). Já em números absolutos, o câncer de pele não melanoma é o principal tanto para homens quanto mulheres (182 mil novos casos previstos), mas ele é excluído da comparação porque raramente é letal.

- A ocorrência dos principais tipos de câncer está relacionada a hábitos de vida que podem ser mudados. Mas isto não significa transferir a responsabilidade só para o indivíduo, que não tem local adequado para praticar atividade física ou acesso à alimentação de qualidade – comenta Ronaldo Silva, oncologista e sanitarista do Grupo COI.

Segundo o especialista, o desenvolvimento de um tumor está, em média, 95% ligado a fatores ambientais e apenas 5% à herança genética. No Brasil, dados divulgados este ano mostraram altos índices de sedentarismo (66%), sobrepeso e obesidade (80% juntos). Além disso, a maior incidência de câncer está nas regiões Sul e Sudeste, áreas mais urbanizadas, com maiores níveis de poluição e maior consumo de alimentos ricos em sódio e gordura, entre outros fatores.

- Só o fato de o câncer hoje matar três vezes mais do que as doenças parasitárias e quatro vezes mais do que os acidentes de trânsito demonstra a importância das ações de prevenção, diagnóstico e tratamento – disse o ministro Alexandre Padilha durante a divulgação, em Brasília, da “Estimativa 2014 – Incidência de Câncer no Brasil”; para marcar o Dia Nacional do Câncer.

O Ministério da Saúde informou que a incidência de câncer no mundo cresceu 20% na última década. Segundo o órgão, a Organização Mundial da Saúde prevê que 17 milhões cie pessoas vão morrer vítimas da doença em todo o planeta, até 2030, e que 27 milhões de novos casos surgirão.

Aumento de 11% nos casos

O câncer é atualmente a segunda maior causa de morte no Brasil e no mundo. Em 2011, 184.384 pessoas morreram de câncer no Brasil. A projeção é de que deverão surgir 576.580 casos de câncer no Brasil em 2014, o que representa um aumento de 11% era relação à previsão nacional para 2012 de números absolutos.

- Há uma transição epidemiológica no Brasil e no mundo, pois há 40 anos morria-se mais por doenças infectocontagiosas. Hoje, com o desenvolvimento econômico, maior acesso à saúde e envelhecimento da população, são as doenças cardiovasculares e o câncer que matam mais – acrescentou Ronaldo Silva.

O coordenador de Prevenção e Vigilância do Inca, Cláudio Noronha, comemorou a queda, no Brasil, dos casos de câncer de pulmão (entre homem) e colo de útero. Pela primeira vez, a projeção indica que, a partir de 2014, este câncer será o terceiro com maior incidência na população feminina, excetuando-se os casos de câncer de pele não melanoma. Até então, o câncer de colo de útero era o segundo mais prevalente entre as mulheres, atrás apenas do câncer de mama. Mas o índice não foi positivamente avaliado pelo oncologista Daniel Tabak, membro da Academia Nacional de Medicina:

- O tabagismo, que aumenta o risco de câncer de pulmão, de fato tem sido mais controlada Mas sem dúvida é decepcionante que o câncer de colo do útero continue aparecendo. Países como índia conseguiram controlá-lo com o papanicolau, e em países desenvolvidos, ele nem aparece mais nas estatísticas. Além da vacinação contra o HPV, que foi introduzida este ano, medidas simples como o exame e o diagnóstico precoce das lesões poderiam reduzir estes números.

A partir de 2014, a projeção é que câncer de cólon e reto supere os casos de colo de útero, atrás apenas do câncer de mama (e do câncer de pele não melanoma). Padilha anunciou que este aumento levará o governo a promover uma reunião com especialistas para avaliar a necessidade de adoção de medidas de rastreamento da doença, com a realização de exames de fezes na população para detectar a eventual presença de sangue e acelerar, assim, o diagnóstico.

- Existe uma questão não valorizada, que é o câncer de cólon, cuja taxa é muito alta tanto nos homens quanto nas mulheres. No Brasil, tivemos campanhas para mamografia, o controle do tabagismo, o exame de PSA, mas não há atenção à colonoscopia, que reconhece uma lesão precursora, que é o pólipo, que quando é re -tirado, elimina o risco da doença – critica Tabak, que ainda ressalta. – A recomendação é que todo indivíduo acima dos 50 anos realize a colonoscopia. Se o resultado for normal, ele será repetido apenas dez anos depois. Se for identificada alguma lesão, o exame deverá ser refeito cinco anos depois.

Em números absolutos, o câncer de pele não melanoma é maior. Mas segundo os especialistas, ele é desconsiderado das estatísticas da maioria dos países porque não incide sobre a taxa de mortalidade. Embora muito comum e preocupante por conta do excesso de exposição ao raios ultravioleta, ele raramente leva à morte.

- Isto confunde a interpretação dos dados – comenta Tabak. – Enquanto isto, o número de linfomas é muito limitado. Eles, por sinal, só surgiram depois de 2009, após a ocorrência do linfoma na presidente Dilma Rousseff. Além disso, o acesso a medicamentos para linfoma só foi introduzido recentemente.

Levantamento publicado na “The Lancet Oncology Commission” mostra que o gasto por indivíduo com câncer, em 2009, no Brasil foi de US$ 8, abaixo de países como Argentina (US$ 12), Chile (US$ 15) e EUA (US$ 460).

O Globo | Batalha contra o Câncer

Abradilan – SP – NOTÍCIAS – 28/11/2013

Jornalista: Flavia Milhorance e Demétrio Weber